Repousando sobre sua tímida fraqueza, reparo todo momento quando você mexe seu cabelo... suas fotos são sempre as mesmas, mas o que me perturba mais não são as imagens impressas, mas sim as que insistem em habitar minha tão conturbada e confusa mente... Seis segundos pensativa, com o garfo na mão... A fragilidade incolor do momento em que se fecha os olhos para dormir um pouco... ou aquela manha de reclamar de um cansaço, só para ganhar um abraço... São sempre os minutos da despedida de uma viagem, no box 14... Ou apenas quando deixa minha casa, dizendo um adeus meio arrependida, contanto os segundos para que a outra noite chegue logo...
Quando faz frio, de meias, coloca seus pés sob os meus, se "aninha" no meu ombro, da aquele suspiro indescritível e adormece... No calor, me puxa para deixo da ducha fria, me "sequestra" mais cedo da empresa para ir a algum clube, ou algo surpreendente...
Quando chega em casa, desabafa sobre seu dia chato no trabalho, no quanto aquelas peruas são chatas, ou o quanto aquele chefe a odeia.... coloca tudo para fora... E ao defendê-la dando razão à sua ira, ela abre o sorriso como uma gratidão dos minutos de "psicologia"...
Quando nos conhecemos, não podia ser mais perfeito... uma fila, uma tarde de chuva e um comentário bobo sobre o tempo. E deste para um sobre a correria, sobre o trabalho, sobre a faculdade... família... telefone...
Nem acreditaria que iria dar em algo. Mas é nessas horas que a gente acaba achando o que deixou de procurar há muito tempo... As juras, as palavras doces, as discussões ásperas que acabam em pedidos melados de desculpas e carinhos... A fuga da rotina, o combustível para que tudo dê certo e a grande sintonia em saber o que o outro está precisando naquele momento...
E nas horas de aborrecimento, quando se está prestes a explodir, e tudo e todos estão um saco, aquela mão no ombro e o silencio de um abraço que ampara e fortalece ao mesmo tempo te leva a uma certeza tão desconcertante que dá até medo...
Os planos, as viagens, as juras... Dividir idéias, apelos, emoções e confissões... Sentir o cheiro dela que fica em todos os lugares quando não estão juntos...
Ter uma admiração recíproca e expontânea, sem pressões e sem cobranças... nem de um e nem de outro... Fazer dar certo... acreditar...
Escrever bilhetes pequenos, cartinhas bobas e idiotas, lembrar de alguma música, de algum lugar, de um "deja vu" que talvez nunca aconteceu conscientemente, mas que leva àquela sensação de é possível... de que TUDO é possível...
Acreditar que pode se voltar no tempo por um segundo para viver uma pequena e momentânea eternidade, daquelas que te inspira a ter pensamentos e idéias tão mágicas que em sã consciência você nunca teria... Extrair de si mesmo o melhor, por que há alguém do seu lado que te faz crer em seus próprios talentos... E se orgulhar de mostrar seus feitos, por que você não faz aquilo só por você, mas também por ela...
Você abre mão de tantas coisas por ela, e percebe que ela também deixa de fazer coisinhas que ela gosta tanto só para te acompanhar nos seus programas chatos e cafonas... E quando você vai fazer as coisinhas que ela aprecia, por mais bobo e fútil que pareça ser, você adora... e sente muita falta quando fica sem...
Como é que tudo isso simplesmente secou dentro de mim? TAlvez é mais fácil se empacotar em seu martírio atual do que se permitir a viver outros... Talvez não haja amor sem dor... Talvez nunca haja uma cura para um coração tão ferido... Talvez um coração vazio fique tão escuro e frio que essa dor constante e incessante fique um pouco oculta, embora sempre e sempre presente.
Talvez nem é a dor da perda ou o sentimento equivocado de abandono é o que mais incomoda... Talvez o que mais seja triste é aquela sensação de fracasso... Você corta um pedaço de pão, coloca o café quente na xícara, pixa um muro, coloca um outdoor ou quem sabe até se perde no tempo por alguém e espera que aquele alguém reconheça isso... Talvez seja esse o terrível sentimento de fracasso, por que você sempre espera mais e mais, e recebe menos e menos...
Senta próximo ao céu, ou foge da cidade ficando em estradas vazias e desertas, apenas olhando para cima, com aquela vontade de estar dizendo palavras legais e trocando carinhos, ao invés de estar sentindo aquela falta estranha e sem nexo, de coisas que você definitivamente nunca viveu. Talvez seja vontade de vivê-las... Talvez seja predestinado a ser um ermitão da vida, excluso de tudo e de todos... talvez até por vontade própria...
Talvez você nem venha a ter filhos, ou viver aquilo tudo que gostaria de ter vivido... Talvez você nunca se apaixone pela melhor amiga da infância, nem da adolescência... talvez você goste da amiga que te liga para desabafar os problemas, mas nunca vai ser forte o bastante para se permitir ficar junto... Talvez você se apaixone por uma estranha a mil kilômetros de distância, e talvez nunca tenha oportunidade de trocar um oi... Talvez idolatraria alguém que só existe dentro de sua cabeça, e ao dormir, fique idealizando um alguém tão perfeito que se esquece da realidade hostil e dura que a vida impõe sob o coração defensivo e entrincheirado em muros de decepções alimentadas pelo terrível anjo interior que queira o proteger de qualquer nova dor que possa vir a aparecer...
Qual a verdadeira razão para estar aqui, neste exato momento? Esta é a questão máxima da vida...
Onde está a realização pessoal? Onde está aquela canção que tocava todos os dias as 5:45 da manhã? A canção dos ventos e do despontamento do horizonte, que parecia sair da alma... onde?
...novamente, elas... as reticências....