terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Pai....

Sim, acabei de perder o sono pensando em meu pai... pensando que ele nunca soube, nem nunca vai saber como eu me sinto e relação a ele... Ele nunca vai saber que eu ligava na empresa dele sem falar nada só pra escutar ele dizer alô... Ele nunca se importou em fazer eu ir e voltar durante dias seguidos para buscar a pensão na distrive, sempre com um volta amanhã, e lá ia eu, a pé, andar os 4km devolta no sol, dos meus 11 aos meus 16 anos... Ele nunca vai saber também que eu não deixei de amar ele nem um pouquinho por causa disso.
Meu pai nunca vai saber que ele era um herói para mim até meus 17. Nunca vai entender como eu queria que ele fosse, ao descrever para meus colegas de escola o super pai que eu nunca tive...
Meu pai nunca vai saber que eu dava razão para as traições dele contra minha mãe, por apenas querer ele próximo. Meu pai também nunca vai saber o quanto foi difícil para eu entender o porque eu tinha irmãos que não eram filhos também de minha mãe... E não vai saber também o quanto foi difícil, tanto para mim quanto para eles entenderem e conviverem com isso também.
Nunca vai compreender que para mim, não tinha coisa melhor do que ficar o domingo todo ao lado dele, sem conversar, olhando os malditos pássaros que ele tinha na pomposa casa do bairro olinda, apenas para ficar do lado dele... Ele nunca vai entender o quanto eu precisava de uma palavra que me desse um rumo, um jeito de definir um caminho na vida... Ele nunca vai entender que muitas das escolhas que eu fiz e que me frustraram, foram unicamente uma tentativa desesperada de fazer com que ele me olhasse por alguns minutos...
Meu pai também nunca vai saber que depois de um tempo, eu quis me casar e ter filhos para fazer tudo diferente... para ser um pai diferente do que ele foi para minha mulher e para meus filhos... Sorte a minha que eu só encontrei mulher pilantra na vida que nunca quis nada sério... Sorte a minha ter chorado tantas noites por tantas meninas que não valiam muita coisa... E isso também ele nunca vai saber... Ele nunca vai saber que eu gostei pra valer mesmo somente de duas garotas, e sinceramente, para ele, isso não importaria...
Meu pai nunca vai saber que eu ia todas as noites para o Uirapuru para jogar meu basket com os caras só esperando dar as 10 horas da noite para subir nas quadras de peteca e ficar ali, em volta dele, vendo ele jogar e os amigos dele me chamando de josé humbertinho...
Meu pai nunca vai saber que eu ja passei várias noites sentindo falta de um cara que me colocasse para cima, dizendo que tudo ia dar certo e que a vida, embora fosse dura, me daria recompensas se eu lutasse...
Meu pai nunca vai saber que eu sei que ele pode ter dois filhos que ele não quis assumir... e que desses uma pode ser mulher, e mais ainda, que pode ter mais de 40 anos... E não vai saber que eu sei que não quis assumir por preconceito, por eles serem negros... Mas eu sei.
Meu pai nunca vai saber a sorte que eu achei que tinha ao nascer filho dele, e nunca vai saber também como ele conseguiu jogar, embora com muito custo, toda a admiração e respeito que eu tinha por ele no lixo... Ele nunca vai saber como eu me senti um nada quando ele dava razão para o funcionário que só sabia roubá-lo....
Meu pai nunca vai saber de nada disso... em contrapartida, eu nunca, mas nunca mesmo, e tristemente, infelizmente e amargamente nunca vou saber o que é olhar nos olhos de um pai e dizer: Cara, eu te amo... Nunca. Nunca vou saber por que minhas energias se foram, e o pouco de amor que eu ainda tinha e queria viver e doar foi secando com tantas desilusões amorosas, tantos tropeços em amizades e tantas decepções pessoais e profissionais, por que eu sempre tive a necessidade de ser importante para as pessoas... não de ser indispensável, mas de ser lembrado em alguns instantes... E isso, meu pai também não vai saber...
Em janeiro de 2010, numa tarde no meio da semana, nas minhas férias, eu tentei, pela ultima vez, fazer com que meu pai soubesse disso tudo, e que soubesse que, embora tudo isso tivesse acontecido, eu ainda precisava de estar junto dele, e que ele me desse algum tipo de atenção...
E o convidei para um almoço (no qual eu pagaria)... E foi assim, o ultimo dia em que vi meu pai. Um cara velho, de 60 e poucos, na frente de um computador, sério, compenetrado, concentrado, atendendo clientes e colegas, telefones ou olhando perdido para o nada fazendo o que ele sempre soube fazer de melhor: Mostrar o quanto eu não sou nada para ele... E o quanto ele não se importa com isso...
Mas isso, parceiro, ele também nunca vai saber....